segunda-feira, 18 de junho de 2007

Quando a filosofia invadiu o rock brasileiro(?)


Para essa primeira semana escolhi um tema que, à primeira vista, parece simples, mas nem de longe o é. Lá nos idos de 1984/1985, a Legião Urbana conseguiu que a EMI escutasse uma demo da banda. Os executivos do selo se interessaram pelo vozeirão de Russo e pelas letras contestatórias e chamaram os rapazes para um teste. É aqui que começa a dificuldade. Depois que os quatro guris entraram no estúdio, a história da música brasileira não foi mais a mesma (filosofia invadiu o rock, que muitos diziam ser chupado lá da England... enfim... balaio de gato rock n´ roll...) e o número de fãs aumentou em progressão geométrica, minuto a minuto. Por isso, falar da Legião Urbana é sempre um perigo.

O processo de gravação envolveu algumas rusgas com produtores e entre a própria banda. Mas esses problemas eram apenas inexperiência, coisa que se resolveu com o lançamento do álbum. A EMI pouco confiava, mercadologicamente, no quarteto (formado por Renato Russo nos vocais, Dado Villa-Lobos como guitarrista, Marcelo Bonfá na bateria e Renato Rocha tocando baixo). Isso por que eles se pareciam com o recém-estourado Paralamas do Sucesso, e a gravadora não pretendia investir muito em 'mais do mesmo'. Com uma divulgação relativa, a primeira prensagem do álbum teve uma venda mais do que satisfatória e as rádios foram jogando o disco completo, música a música, nas listas diárias.

Das 11 músicas que estão nessa bolachinha, só a última, a melancólica e estranha 'Por Enquanto', foi feita durante as gravações. O resto era, de certa maneira, material já criado, quando Renato Russo ainda era o 'dono' do Aborto Elétrico. Abrindo os ouvidos para enxergar além dos clássicos desse álbum ('Será', 'Ainda é Cedo' e Geração Coca-Cola'), podemos perceber pérolas que mostram a preocupação que Renato tinha com o que acontecia à sua volta.

Jovem nascido e criado na ditadura, Russo compôs 'A Dança', que fala de jovens acostumados a excessos ('você não tem idéias para acompanhar a moda, tratando as meninas como se fossem lixo, ou então espécie rara, só a você pertence'), 'Soldados', canção que aborda o amor recém-descoberto entre dois milicos ('não sei armar o que eu senti, não sei dizer que vi você ali [...] quem vai saber agora o que eu não fiz, como explicar para você o que eu quis'), 'O Reggae', hino que brada as violências da Escola como instituição ('[...] o meu primeiro diz na escola, como eu senti vontade de ir embora, fazia tudo que eles quisessem, acreditava em tudo que dissessem') e o maior clássico de todos, 'Baader-Meinhof Blues', canção que abre dizendo que 'a violência é tão fascinante e nossas vidas são tão normais'... Quer coisa mais atual...? É por essas e outras que ouvir os álbuns seguintes da Legião dá uma certa gastura... O que começou inspirado no punk inglês do Sex Pistols e outros mais, com um talento contestatório de dar inveja, abre espaço (demais) para o amor e suas desilusões (principalmente a partir do quarto álbum do grupo, o 'As Quatro Estações'). E assim, a banda que protestava contra as injustiças do mundo deu lugar àquela coisa pungente que Renato Russo tanto sabia fazer e que conquistou muitos outros fãs. Mas isso é assunto para outro artigo.


Legião Urbana - Legião Urbana

Será
A Dança
Petróleo do Futuro
Ainda é Cedo
Perdidos no Espaço
Geração Coca-Cola
O Reggae
Baader-Meinhof Blues
Soldados
Teorema
Por Enquanto

Coluna publicada originalmente no Jornal O Dia, no Caderno Torquato da edição de 21.06.07

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