segunda-feira, 18 de junho de 2007

O poder do baião


Luiz Gonzaga do Nascimento, compositor, cantor e instrumentista, nasceu em Exu - PE (13/12/1912) e faleceu em Recife - PE (2/8/1989). Filho do sanfoneiro Januário, que tocava em bailes e nas horas vagas consertava sanfonas, aprendeu a tocar o instrumento com o pai. Nascido numa fazenda, desde pequeno trabalhou na roça, tocando em forrós e feiras. Já era relativamente conhecido como sanfoneiro, quando, em 1930, fugiu de casa e foi para Fortaleza-CE, onde ingressou no Exército.

Essa poderia ser uma breve história do homem que adotou o nome de Luiz Gonzaga como marca de um vaqueiro que sabia tocar safona e retratou como poucos a realidade do sertão nordestino.

Quando estava no exército, durante a Revolução de 30, o batalhão no qual Gonzaga servia deslocou-se para a Paraíba e outros Estados do Nordeste, seguindo depois para Juiz de Fora MG. Lá conheceu Dominguinhos Ambrósio, famoso sanfoneiro mineiro que também estava no Exército e com quem estudou, além de aprender as músicas mais populares no Sul.

Essas músicas populares do Sul serviram para Luiz abrir espaço na cena artística do Rio de Janeiro, onde passou a viver depois de dar baixa no Exército. Tanto mexeu, tanto virou, tanto tocou que terminou por conseguir cada vez mais espaço na cidade. Durante uma das festas em que tocava, um grupo de estudantes cearenses puxou a orelha do Velho Lui, um dos muitos apelidos que o artista ganhou. A cobrança era para que o artista tocasse mais composições de sua terra e que lembrasse seus costumes e experiências. Crítica ouvida e assimilada, Luiz Gonzaga passa então a entoar os 'cantos de sua terra'.

Uma das amostras mais significativas desse canto, quando o artista, já calejado das intempéries do cenário musical, fez o show no Teatro Teresa Raquel, que originou o álbum Volta pra Curtir: ao Vivo, um lançamento de 2001 de uma obra que foi realizada em 1972.

As músicas executadas nesse show dão muita liberdade interpretativa, além de uma possibilidade de improvisação fora do comum, características que Luiz sabia aproveitar muito bem. Alguns dos clássicos cantados nesse álbum são Boiadeiro, Cigarro de Paia, Lorota boa, Oiá eu aqui de novo, Asa Branca, Volta da asa branca, Assum Preto, Ana Rosa e Estrada de Canindé.

Em Boiadeiro, Gonzaga faz um retrato da realidade que o cerca, mostrando, como em várias outras canções, as experiências que teve com seu pai e durante sua vida. "De manhazinha quando eu sigo pela estrada/Minha boiada pra invernada eu vou levar/As cabeça é muito pouco é quase nada, mas não tem outras mais bonitas no lugar", canta Luiz Gonzaga de forma lenta e compassada, saboreando as sílabas, como se a cada palavra falada a imagem se formasse diante de seus olhos e ele esperasse até o último segundo para passar para a próxima palavra e imagem.

Na música Estrada de Canindé, mais uma vez a realidade do campo é recriada nos versos do Gonzaga. A distância entre o desenvolvimento da cidade grande e a simplicidade do sertão inspiraram Luiz a cantar e homenagear os versos marcantes dessa canção. "Que bom, que bom que é/Uma estrada e uma cabocla/Cum a gente andando a pé/Que bom, que bom que é/Uma estrada e a lua branca/No sertão de Canindé", vai dizendo Lui. Uma verdadeira amostra de como o amor pela sua origem, mesmo que sendo cruelmente seca, pode originar resultados tão bonitos.


Luiz Gonzaga - Volta pra Curtir

Boiadeiro
Moda da mula preta
Siri jogando bola
Qui nem giló
Asa branca
Assum preto
Hora do adeus
Estrada de Canindé
Numa sala de reboco
Adeus, Rio
No meu pé de serra
Pau de arara
Derramaro o gai
A feira de Caruaru
Olha a pisada

Coluna originalmente publicada na edição do Jornal O Dia, no Caderno Torquato de 26.07.05

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