sábado, 12 de julho de 2008

A mentira é contada e repetida, repetidas vezes

"'Tenho 30 anos', falei. 'Estou velho demais para mentir para mim mesmo e chamar isso de honra'." Assim sacramentou F. Scott Fitzgerald, no seu O Grande Gatsby. O americano não passou nem perto de errar. Com o tempo vai ficando mais e mais difícil para quem não é mononucleado ignorar essa verdade.

Aos 33 anos, Renato Russo provavelmente já estava bem consciente disso. Ele não era bobo. Devia saber que era um letrista mediano, mas dono de um estranho carisma e de uma capacidade de traduzir sentimentos de forma apropriadamente rasa. Devia saber disso, mas, como é comum nas pessoas comuns, também devia se enganar, acreditar mais em si do que a verdade apropriadamente apontava.




A Legião Urbana foi o “grande” baluarte da música pop no Brasil durante bons anos da década de 90, principalmente pela figura mítica que os fãs da banda delegavam a Renato. No início espelhado no punk rock do Sex Pistols, Ramones e The Clash, mas com inspiração também nas obras de artistas como Joni Mitchell, Neil Young e The Smiths, o grupo apresentou uma seqüência de discos que justificam bem esse O Descobrimento do Brasil. Legião Urbana [1984] é propositalmente amargo e transpira ironia, ainda que inocente; Dois [1986] é romântico, tanto ao falar de amor quanto para passar as mensagens de protesto ainda tão fortes no discurso de Renato; Que País é Este (1978/1987) [1987] resgata canções da época do Aborto Elétrico, em que o punk rock era ainda mais forte, e traz duas inéditas apenas. As Quatro Estações [1989] já apresentava a virada no lirismo de Renato, com seus amores e dissabores estampados nas harmonias de Dado Villa-Lobos, virada essa interrompida com o taciturno e introspectivo V [1991].

Então chegamos ao O Descobrimento do Brasil [1993]. O disco resgata as guitarras, as letras fortes, mas rasas, dentro da já tradicional escrita de Renato. "Vinte e Nove" referência ciclos de vida com astronomia, abre o disco e fala estritamente de como Renato levou tempo para superar os vícios que tanto atrapalhavam suas relações. "A Fonte" e "Do Espírito" sempre foram músicas complementares para mim, já que enquanto uma fala “O que há de errado comigo/Não consigo encontrar abrigo”, a outra entrega um “Sai de mim/Que eu não quero mais saber de você”. "Perfeição" é a letra contundente menos brega do disco [já que a receita presente em “Os Anjos” é o ponto baixo do álbum], ganhou clipe e é o ponto alto da obra, ao lado de “Giz”, a preferida de Renato e uma das suas melhores letras.




Temos a passável O Passeio da Boa Vista" e a “biográfica” "O Descobrimento do Brasil", em que Renato conta a pretensa história de uma fã que o escrevia muito e falava da sua vida para ele. "Os Barcos" é centrada na certeza de que um dos lados sempre se dá muito mal nos términos de relacionamento [e Renato tinha uma tendência a ser/expressar esse lado], "Vamos Fazer um Filme" encanta pelas imagens nostálgicas, assim como há um encanto estranho em "Um Dia Perfeito", acentuado quando se percebe as vozes de crianças ao fundo. "Love in the Afternoon" é um tipo de carta de despedida a um amigo do vocalista que faleceu e "La Nuova Gioventú" assusta com a distorção, chamando atenção para a letra e para o verso, mais uma vez raso, mas nunca fraco: “Com você por perto eu gostava mais de mim”. “Só por Hoje", no entanto, fecha o álbum falando mais uma vez de ciclos. Dessa vez, mais reflexivos, embora mais diretos. E como todos eles, estes têm seu começo-meio-fim-começo-meio...





Este disco está disponível aqui.

3 Comentários:

Blogger Alícia Melo disse...

sinto-me mais velha do q sou ouvindo essas músicas. =)
=*

12 de julho de 2008 às 15:16  
Blogger Biani Luna disse...

Cara, não vou mentir também. Não gosto muito de legião.
Gosto de muitas letras, mas poucas músicas.
Beijos,

15 de julho de 2008 às 18:32  
Anonymous Anônimo disse...

Fico deprimido quando ouço L.Urbana.
Mas isso não diz realmente se a música é boa ou ruim, certo?

30 de julho de 2008 às 11:47  

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial