quinta-feira, 13 de março de 2008

O que é que o paulista tem (Parte III)
Por Jader Pires
"E os novos baianos passeiam
Na tua garoa
E novos baianos te podem
Curtir numa boa..."



Tem aquela velha história que dizem que no Brasil, se plantando, tudo dá. A terra é boa, minha gente...a terra é boa.

Na música ocorre o mesmo.

O Brasil é o único (ou parte de um grupo muito seleto de países) que consegue absorver qualquer tipo de sonoridade que venha de qualquer parte do planeta e tornar genuinamente seu. O movimento antropofágico da década de 20 do século passado já prenunciava e a tropicália reafirmou a sentença de que aqui, quando o assunto é artes, se plantando, tudo dá.

Índios, negros árabes, judeus. Americanos querendo acabar com a ameaça de uma América comunista, CIA botando o dedo em assuntos de todos os países latino-americanos. Diversos fatores para entrada e saída de vivências tão diferentes nesse país que já se consagra detentor de uma diversidade incrível devido ao território imenso. São 26 estados e um distrito federal, cada qual com seus trejeitos cultivados através dos séculos, apimentados por colonizações diferentes, climas diferentes, momentos diferentes e importâncias diferentes contribuindo mais e mais para a climatização dessas culturas tão distintas.

O gaúcho colono, com seu poncho e seu amor pela região do Rio das Pratas. O carioca malandro, com seu terno branco e sua inseparável cerveja no bairro da Lapa. O mineiro "come-quieto", o nordestino sofrido do sertão. O frevo, a ciranda, o tecnobrega do Pará, o reagge do Maranhão (considerada a segunda Jamaica), o tango argentino, o jazz dos yankees, a cítara e o alaúde do oriente. Coisas de dentro, coisas de fora, coisas que se fundiram e viraram coisas e que não deixam de ser coisas intimamente brasileiras.



São Paulo hoje é a capital brasileira dos negócios e, na terra que um dia foi do café, hoje é da cultura. A cidade importa e exporta cultura que hoje é um dos comércios mais rentáveis que se pode haver. Dentro dessa máquina de fazer dinheiro que é o show business paulistano, há certos artistas que podemos chamar de "vírus". São pessoas que conseguem adentrar e usar a engrenagem cultural para fazer coisas sinceras e não tão rentáveis quanto superproduções cultivadas e desenvolvidas na metrópole.

O Projeto Cru usa a formação de um power trio de jazz. Nesse nipe jazzístico, um pianista, um baixista e um baterista formam a tríplice configuração para mandar notas tornas e improvisadas tão provocantes desse estilo musical. Simone Soul (bateria e percussão), Marcelo Monteiro (sopros diversos) e Alfredo Bello (baixo e tecnologia) se apropriam dessa formação para criar um estilo de som muito brasileiro, muito versátil e muito tribal. A absorção de diversos estilos e experimentações é total e plenamente aceitável pelos ouvidos. A brincadeira nos shows é constante e consistente, aplicando bases das canções gravadas no álbum homônimo (lançado em 2003) com improvisos que hora são agressivos, hora metódicos.

O que impera nas músicas do Projeto Cru é a brasilidade intensa, transcendendo divisas estaduais, quebrando a "paulistaniedade" e tornando-se "cidadãos do Brasil".



A canção Evolução (que abre o cd do grupo) é uma ambientação para se adentrar nessa mata fechada. Batidas incessantes e uma percussão que aguça a curiosidade, como se fosse um perfume de plantas exóticas que atraem a atenção para um sopro tranqüilo e bem traçado. Mundo Embolado já traz uma respiração de quem está à procura de um descampado pra abrir mais a mente. Quem ouve essa música recebe na letra dicas sobre o mundo, sobre a vida que não é tão simples quanto se parece, mas é mais deliciosa quando se tem uma outra percepção dela. Formigas, roseiras e asfalto se misturam com a batucada e a melodia nordestina que faz pessoas saírem saltitando na vegetação rasteira com os pés descalços. Quando retomamos o rumo com a canção Caminho, um baixo tocado com o arco chama novamente os sopros e começa a ser tocado com os dedos, bem grave, alternando as melodias ao longo da performance soando como a trilha de uma procura mais aguçada quando se embrenha novamente na mata densa de notas tortas e retorcidas. Daí pra frente conseguimos andar pelas florestas do norte do país, passando pelo sertão empoeirado e pelo cerrado castigado pelo calor. Atravessamos pastos de intensa movimentação da boiada e descansamos um pouco pelo litoral e as maravilhosas sonoridades da praia e do mar. Descemos com a intensidade do som até os pampas e retomamos o trajeto até firmar os pés no chão cinza de pedra e piche. É textura de todos os locais culminando na estética deliciosa e rica do trio que mostra que São Paulo não é o Brasil e o Brasil Não é São Paulo e que, na verdade, nada disso importa, pois a musica brasileira é rica em qualquer ponto sob qualquer circunstância.

É Brasil que não acaba mais e brasilidade até a alma!
Desvende os sons do Projero Cru aqui!

3 Comentários:

Blogger Carlos Lustosa Filho disse...

Bicho, eu conheço o primeiro CD do projeto Cru e achei bem interessante... hehehe

13 de março de 2008 às 09:53  
Blogger Carlos Lustosa Filho disse...

(postei sem terminar o raciocínio...)

O interessante é que pra mim que moro aqui no PI, SP sempre foi uma icógnita musical.

Desde que conheci mutantes mais profundamente é que eu percebi que existem muitos artistas legais e criativos aí, não só coisa-comercial como eu pensava... o maior exemplo pra mim é a Céu - pq enfim... - mas descobri também o Beto Linhares e uma pá de cantoras interessantes também (me atrai mais a MPB e tal).

Acho que é bem por aí, SP tem o dom de misturar e tem mais é que investir nisso: som urbano e com um sotaque brasileiro sempre...

13 de março de 2008 às 09:58  
Anonymous Anônimo disse...

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