terça-feira, 28 de outubro de 2008

E assim segue...

Durante mais de um ano, o Calo na Orelha teve como casa este blogspot aqui.

Hoje isso mudou, o blog cresceu de um espaço para exercício da resenha cultural e agora somos, eu, Pedro Jansen, e Jader Pires, co-editores do site Calo na Orelha.

Com muito orgulho, sempre.

Você que nos lia aqui está convidado a conhecer a nova casa. Esperamos que goste.

Abraços!

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Parece que faz tanto tempo...
Por Jader Pires.




Quando lançou seu primeiro trabalho solo (Yours To Keep) em 2007, Albert Hammond jr disse que “se você não estiver procurando por um quarto disco do Strokes, esse vai ser um álbum para se apaixonar”. Seguindo a mesma linha de raciocínio, o guitarrista californiano que ganhou o mundo em Nova York continua doce e dúbio em ¿Cómo Te Llama?, mas com um gás renovado.

 

O rapaz é supostamente uma máquina criativa. Carreira solo bem comentada justamente pelas composições que fogem um pouco da banda que o projetou e agora, além de um novo álbum, começa a atuar também no mercado da moda, criando modelos de ternos com a designer Ilaria Urbinati. Territórios desconhecidos provaram ser bem férteis para este moço que sempre teve uma cara confiante. Não uma confiança de quem sabe fazer, mas de quem simplesmente faz.

 

Em ¿Cómo Te Llama?, temos a voz que ainda encanta por sua mistura ditosa e levemente melancólica que deixa todas as composições carregadas de uma dualidade entre alegria e tristeza (fator primordial para o estilo power pop que Albert resolveu adentrar com seu projeto solo). GfC é o exemplo mais interessante de uma letra muito triste (“inside me there's a sad machine, wants to stop movin'”) com um arranjo mais alegre e uma voz que caminha nas duas direções para ser interpretada conforme a disponibilidade do dia para se estar feliz ou triste.



O trio que o acompanha é o mesmo e isso dá um tom mais ímtimo e, embora não inovando assim como em Yours..., estão claramente mais descontraídos. Essa tal intimidade tanto da banda, como a de Albert em compor sozinho, fez com que, além de lançar dois discos pra um mesmo projeto paralelo num período de um ano, as alternâncias de estilo também se fizeram aparecer na obra. Toda a sonoridade é mais solta, ampla e segura que no trabalho anterior fazendo até com que uma canção como In My Room (uma das melhores) pudesse ser gravada com uma pegada deliciosamente parecida com Strokes, mas sem soar realmente como a banda e mostrando que o garoto dos ternos também sabe falar de relacionamentos conturbados tão bem ou, dependendo da liberdade dos olhos e ouvidos de quem ouve, melhor que Julian Casablancas.

 

As canções Lisa e Rocket são bem densas e industriais enquanto You Won’t Be Fooled By This é uma (em)balada gostosa e sincera que antecede a bela Spooky Couch, uma viagem de teclados e cordas que contou com a participação de Sean Lennon (que já havia participado do álbum anterior). É uma canção instrumental cercada de surrealismos sonoros, simples e encantadores.




Logo após, uma seqüência ótima em que Albert leva todas as características de seu som para a concepção de dub poderoso (Borrowed Time), um emaranhado de alegrias (G Up) e um reggae com direito a inserções de percussão (Miss Myrtle), todos aos moldes de ¿Cómo Te Llama?, que é finalizado com a inspirada Feed me Jack or How I Learned To Stop Worrying And Love Peter Sellers. Aliás, a julgar pelos dois trabalhos que Albert já lançou em sua trajetória solo, posso concluir que o garoto sabe muito bem como terminar um cd.



Albert começa já na saudade (parece que faz tanto tempo...) e termina sem demonstrar um mínimo de cansaço ou falta de motivação (não é tarde demais pra ficar um pouco mais...). Se depender de mim, será sempre bem vindo. Se depender de um som sempre com essa cara boa, será sempre bem esperado.


Mate a saudade de Albert Hammond Jr. Aqui



segunda-feira, 6 de outubro de 2008

A satisfação de uma curiosidade antiga

Elvis Costello nunca foi exatamente o tipo de artista que sempre figurou na minha discografia básica. Havia uma curiosidade distante desde a inserção do artista no clássico [ao menos para mim] Austin Powers: The Spy Who Shagged Me, mas nada além de uma curiosidade.



Eis que o tempo cuida de provocar certos incidentes maravilhosos e numa noite qualquer de junho o amigo Rodrigo Mesquita deixa a dica: "o novo do Elvis Costello tá muito bom". Deixei aquilo na cabeça, mas tão assoberbado de trabalho estava que ficou só na cabeça mesmo e nunca passou para o SLSK ou coisa que o valha. Até que um dia, esperando o início de um show de amigos meus, fui dar uma banda pela FNAC e no meio da seção de CDs se destacou a capinha roxa com o nome de Costello em laranja. Momofuku, disco cujo nome homenageia o inventor do macarrão instantâneo Ando Momofuku e o espírito em que o disco foi gravado, esperava pela minha audição, quieto e passivo.



Selecionei o tal disco no seletor da loja de departamentos e No Hiding Place invadiu o péssimo fone de ouvido. E mesmo com a qualidade duvidosa daquele som que chegava aos meus ouvidos, sabia que estava diante de uma obra singular do cantor e compositor inglês. Mesmo com a presença constante de baladas de qualidade, o forte de Momofuku são bons rocks, com riffs espertos e arranjos criativos e dançantes. Sim, por que não se dança só músicas incrivelmente animadas. O meio termo também é convidativo e o The Imposters, banda que acompanha Elvis Costello, soube executar isso com maestria.

O trio que abre o disco tem uma beleza singular. Me interesso muito pelas músicas que abrem discos, geralmente são elas que trazem uma mensagem escancarada, são elas que traduzem a cabeça do artista dentro daquela produção. E No Hiding Place já abre o jogo, dizendo que pagou seus pecados imortais, que conhece o inimigo que um interlocutor traz consigo e que não há esconderijos. Não, realmente não há esconderijos para nada, seja você fiel a um deus ou ateu. É algo que se precisa aprender a lidar: um problema não some só por que você fechou os olhos.



A segunda canção, American Gangster Time, com um arranjo de piano simples e gracioso capaz de deixar qualquer 5º beatle com inveja fala do mundo da máfia americana, seus excessos e extravagâncias. Tudo com um toque de bom humor e ironia. Turpentine, no entanto, é ácida, longa e "sombria", com aspas para determinar a dificuldade em precisar os limites deste sombrio. Trata sobre passado, acidentes com química e outras experiências ruins. Uma tríade poderosa para abrir um disco.

Então temos a primeira balada, Harry Worth, apresentando um atestado de "memento mori" para um casal que aparentemente não está se dando bem. Destaque para os arranjos das faixas seguintes. Flutter and Wow, Stella Hurt [com seu piano nervoso marcando o baixo e falando da minha mulher preferida, toda e qualquer Stella...], Mr. Feathers conta uma história com voz, piano e bateria.

My Three Sons é o momento corujice do disco, em que Costello declara sua completa paixão pelos três filhos, dois deles com a pianista e cantora Diana Krall, com quem é casado desde 2003. Song with Rose e Pardon Me Madam, My Name Is Eve são músicas um tanto menores dentro do disco, mas que mantém o esmero de Elvis nos arranjos de sua obra. Por sua vez, para fechar o disco, nada mais apropriado que o ótimo e suave rock de Go Away.



Momofuku é uma obra justa, sem grandes supresas, mas que mantém acessa a chama dos álbuns como amostra de um artista. Se lançado apenas como diversos singles, online e sem a formatação de obra fechada, talvez o álbum fosse um estrondoso sucesso, indo além do modesto 59º lugar da Billboard. Ainda assim, Momofuku vale o download, a audição carinhosa e o suspiro de satisfação.




Você pode baixar este disco aqui.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

O lado negro da força
Por Jader Pires


O Justice é um Frankenstein de duas cabeças. Uma é boa, artística, centrada nas batidas certas pra fazer a coisa ferver. A outra é vil, violenta, desprovida de dignidade e qualquer tipo de sentimentalismo. É uma mistura de graciosidade e agressividade gratuita. Uma cabeça tentando dominar a outra num jogo psicológico sem tréguas, sem vencedores aparentes. Esse monstro tocou em São Paulo esse final de semana.




O ímpeto do duo francês encontrava-se atrás de uma enorme cortina negra que estava postada frente ao palco do Skol Beats 2008. Após a apresentação interessante do Mixhell (formado por Iggor Cavalera e sua esposa, Laima Leyton), as tais cortinas se abriram e liberaram a visão de dezenas de amplificadores Marshall simetricamente dispostos em cada um dos lados, que davam poderio ao altar eletrônico enfeitado por uma cruz bem no centro que emanava uma claridade branca que até o momento não sei dizer se era alegria ou um pedido de ajuda. Por trás de todo esse aparato estavam as duas mentes que, juntas, metralharam inúmeros elementos sintetizados que eram, ao mesmo tempo, atraentes e perturbadores.

 

Assim como no álbum (ou Cross - 2008), Genesis foi a canção escolhida para o prenúncio do apocalipse sonoro. Pancadas graves golpeavam meu estômago e reverberavam em minha garganta, juntamente com as inserções de Phanton (ainda antes de o primeiro som terminar). Era uma seqüência interminável de impactos e alívios que ainda não entendi como pudemos todos suportar uma tortura com tanto prazer.





Gaspard Augé (de cabelos enrolados) parecia mais concentrado, um ar mais hardworker (sem deixar de curtir e aproveitar os momentos de maior rockstar da atual cena eletrônica). Do outro lado, Xavier Rosney (de cabelos desgrenhados) já se mostrava mais despojado, com olhares fulminantes para a platéia (ao melhor estilo Liam Galagher), enquanto degustava todos os cigarros possíveis e imagináveis naquela uma hora de show. D.A.N.C.E. e The Party viraram baladinhas, mas isso não quer dizer que ficaram menos nervosas (até nos momentos mais carinhosos, a besta dentro da dupla se manifesta de modo rude, incômodo). Já nos momentos críticos, as provocações são das mais perigosas. O Remix de We Are Friends (original dos remixadores ingleses do Simian Mobile Disco)  foi iniciada só com a voz (because we are your friends/you’ll never be alone again) histericamente acompanhada na platéia, com repetições de “oh, come on! oh, come on!”, enquanto Stress virou um épico de cólera. Colagens de violinos dramatizavam ainda mais a tensão e a pancadaria psicológica não dava fôlego (enquanto a pancadaria física rolava no chão do Anhembi, com pés já completamente tomados pela adrenalina).

 



O inferno só parou (infelizmente) quando a música cessou e Garpard apareceu no telão com os braços formando uma cruz e Xavier já desaparecia no breu do canto do palco. Soturno, pesado, frenético e competente. O Justice é uma extravagância poderosa e detentora de um charme bem irascível. Difícil é sair ileso.


(Fotos gentilmente cedidas por Marcelo Elídio

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Uma noite linda de morrer (Mombojó)

Ouvi exaustivamente o primeiro disco do Mombojó, o interessantíssimo nadadenovo, de 2004. Antes de ouví-lo, no entanto, fui a um show da banda na minha cidade-natal, Teresina, em 2005. Um show que me rendeu histórias das mais diversas magnitudes, um show que me fez pensar na vida [sério] de diversas maneiras. Até hoje, quando escuto Mombojó, penso naquela noite de sexta-feira, num julho perdido e de clima ameno.

Ou pelo menos pensava. Hoje o Mombojó é muito diferente do que era naquele 2004. A morte de O Rafa, responsável pelas flautas, e a saída de Marcelo Campello, dono dos violões, cavaquinhos e escaletas dos dois primeiros discos da banda, mudou muito [ou seria "demais"?] a cara do grupo que me fascinou naquela noite hoje já tão passado. O que é natural e até esperado. Afinal, já se vão três anos desde o primeiro encontro e cinco do nascimento da banda. Mudar, além de inevitável, era essencial com tantos processos rodeando o Mombojó.



Em junho deste ano fui a um show da banda no Studio SP e pude ver como estava aquele adorado grupo com dois integrantes a menos e com todas as particularidades que isso traz. Mais seco, mais rock, menos samba, com menos detalhes. Foi um show difícil, e ainda assim divertidíssimo.

Mas bem menos divertido que a apresentação que vi no último sábado, 13/09, no mesmo Studio SP. Antecedido pelo fantástico show de China, a invasão pernambucana foi completada quando Felipe S (voz), Samuel (baixo), Vicente Machado (bateria), Marcelo Machado (guitarra) e Chiquinho (teclado e sampler) puseram os pés no palco. Mombojó e China, Cancêr e Você Não Serve Pra Mim, sai China, fica Mombojó.



Misturando músicas do primeiro [e melhor disco, na minha opinião] com músicas do segundo disco e canções inéditas, que devem figurar no álbum a ser lançado em novembro deste ano, não houve razão para não abrir facilmente o sorriso que me foi tão caro no show de junho. Banda afiada, sorriso nos rostos, público acompanhando as canções nota a nota...

É tragicômico pensar que, quando Felipe S abre a boca para professar um "deixe-se acreditar/nada vai te acontecer/tudo pode ser/nada vai acontecer, não tema/esse é o reino da alegria" [de Deixe-se Acreditar], todas as pessoas dentro do Studio SP [me permitam aqui uma generalização descarada] berram com ele a plenos pulmões. Aqui têm-se a faca de dois gumes do homem-artista: "se fossem opções rigorosamente excludentes entre si e você pudesse escolher uma delas, desejaria ser um grande artista ou um cara anonimamente feliz?", como bem escreveu Alexandre Inagaki.



É trágico pensar nisso por que, como homens, estes rapazes vivem sua arte e sofrem por terem nela seu trabalho, mezzo recheado de alegrias, mezzo entremeado de pequenos baques e dramas; e que, como artistas, estes homens apresentam suas vidas/experiências/humores para um público sedento por uma confidência, uma relação próxima. E cômico por que estas elucubrações não fazem o menor sentido quando se vê o Mombojó no palco: todos os pequenos dramas, da vida ou das letras, são substituídos por uma "tremenda anarquia, que vai pintando as ruas de alegria"...





(Fotos gentilmente cedidas por Gian Lucca)
Uma noite linda de morrer (China)
Por Jader Pires


Depois de uma tarde de sábado reconfortado na companhia de amigos da melhor estirpe, vi a noite caindo pesada com um vento forte que sugeria um fim mais próximo, mas que na verdade estava a sussurrar o começo de algo especial.

 

O Studio SP é reduto de quem gosta de música brasileira e corre atrás de novas sonoridades que na verdade não tem nada de novo, só não é moldado nos padrões propostos (ou impostos) pela atual indústria fonográfica nacional. Para outros artistas, o Studio SP também é um refúgio para conseguir shows bons sem ter que cair nas garras das gravadoras, mas acabam por focar suas apresentações mais em Sampa (a terra prometida), deixando muitos outros lugares do país a ver navios. Opções da vida (não se pode ganhar sempre).



Assim como já foi dito aqui no Calo na Orelha, Pernambuco deve ter algo de errado na água ou a tensão de pensar tubarões nas praias pra ferver tanta musicalidade boa por lá. Zilhares de bilhares de bandas, grupos, cantores, interpretes, compositores e todo tipo de mau elemento que faz um ótimo show saíram dos mangues, das regiões da mata ou do eixo Recife-Olinda pra fazer a vida com suas músicas. No sábado, depois de uma tarde reconfortado na companhia de amigos da melhor estirpe, eu fui ao Studio SP pra ver o show de um bando de pernambucanos mau elementos que saíram da lama, da mata e do eixo pra viver de música. E ó só, como vivem.

 

Enquanto estávamos sendo aquecidos passivamente e positivamente pela discotecagem precisa do, às vezes DJ, quase sempre vocalista da banda Jumbo Elektro, Tatá Aeroplano (que fazia o som da casa na noite), a H Stern Band adentrou ao palco, ainda no escuro, portando seus instrumentos e, ao centro, China estava impecavelmente posicionado com sua camiseta listrada, seu chapéu quadriculado e microfone em mãos.




O groove poderoso de Colocando Sal nas Feridas adentrou em todos os ouvidos quase ao mesmo tempo em que a luz de um amarelo forte atacou todo o palco com um “Mick Jagger brasileiro” (“Não... é o Mick Jagger Chinês!”, disse uma amiga da melhor estirpe) já inerte em seus movimentos epiléticos, fazendo bicos e soltando as palavras faladas da canção. Sua voz era completamente encoberta por uma maré de berros da galera na pista, praticamente toda tomada por fãs (característica do local). A banda toda é detentora de um equilíbrio sonoro tremendo, colocando a potência certa, o swing certo, a paulada certa, a malemolência certa. O Cantor e compositor China (ex-Sheik Tosado) parece estar abduzido o tempo todo, imerso completamente em sua função. Dança freneticamente, canta com sinceridade e contagia todo o ambiente. 

 

Praticamente tudo de seu último álbum (Sumilacro, 2007) é tocado com uma ótima pegada dançante com pitadas bem pesadas. Jardim de Inverno, Sem Paz tiveram suas letras acompanhadas de ponta a ponta, com explosões nos refrões, nas vozes, nos pulos e nos dedos apontando o ar, o teto, o amigo ao lado, o China, a banda. Asas Nos Pés foi provavelmente a mais agitada: público faiscando e China com seus espasmos bailados, enquanto Um Dia Lindo de Morrer e Canção Que Não Morre no Ar foram as mais comemoradas.




Tudo escuro de novo. China os chama, assim como previsto. Mesmo assim, a sensação é de surpresa quando o Mombojó todinho sobe ao palco, cada qual com seu instrumento e fazem a seqüência final que contou com Câncer e uma releitura bem densa de Você Não Serve Pra Mim do Roberto Carlos que foi engolida por um final alucinante da banda descendo o cacete do hardcore.

 

Já tinha garantido a minha noite linda de morrer. O China já tinha garantido a sua noite linda de morrer.  Estávamos ambos reconfortados por amigos da melhor estirpe, no Studio SP, envolto de maus elementos que respiram música. Melhor, impossível.



(Fotos gentilmente cedidas por Gian Lucca)

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

A ciência do Metal(lica).
Por Jader Pires



Enquanto os olhos da ciência estão voltados para a experiência do grande acelerador de partículas (LHC) que “recria” em menor escala (obviamente) o fenômeno do Big Bang, tivemos no dia 12 último um fenômeno interessante de lapso no espaço-tempo.





O Metallica lançou seu nono disco de estúdio (sem contar o duplo Garage Inc., que contém apenas covers) chamado Death Magnetic (será que tem algo a ver com os tais testes na França e Suíça!?). O lapso aconteceu porque, em resumo, a obra toda parece ter sido concebida entre o clássico ...And Justice For All (1988) e o primeiro chute no saco dos fãs, Black Album (1991). Toda a sonoridade de Death Magnetic parece ser uma mistura desses dois álbuns ou então influências diretas da primeira fase da banda (aquele metal agressivo e muito bem trabalhado) e a segunda (o metal mais denso, potente e comercial). O mais curioso é que o produtor Bob Rock foi um dos principais responsáveis pelas várias facetas que o Metallica teve durante toda a carreira e, nesse novo trabalho, a produção ficou com o excelente Rick Rubin, que já trabalhou com Slayer, System of a Down e Rage Against The Machine. Com essa alteração, a banda acabou optando por criar o que sabe fazer de melhor, após o enorme fiasco de St. Anger (provavelmente quase tão grande que o Big Bang e definitivamente maior que o teste que chegou a ser ridiculamente acusado de criar um buraco negro e acabar com todo o universo).




É muito Metallica. A complexidade certa nas linhas de guitarra, as paradas, as alternâncias na melodia, os solos. That Was Just Your Life (com exorbitantes 7:08 min) já inicia a pancadaria com o vigor da fase inicial da banda, com direito a berros agudos de James Hetfield, mas bem mais contido do que o garoto que liderava a banda no início dos anos 80. Outro ponto que vale ressaltar é que as composições permanecem com todas as características metallianas, com frases como “the slave becomes the master” (The End of the Line), “we die hard” e “show your scar” (Broken, Beat Scarred). O single The Day That Never Comes é a que mais tem a cara do Black. Um começo lento e a voz bem encaixada de Hetfield no tempo todo da canção pesada, mas comedida.

The Unforgiven III soa como tiro no pé (ou súplica de mais grana nos bolsos), mas surpreende pela idéia que a letra passa e a inspiração máxima (ou nostalgia maior) está na derradeira My Apocalypse, uma peça pesada até os ossos digna de destaque nas apresentações ao vivo.




Com o tempo eu aprendi a enxergar coisas boas em (quase) todos os trabalhos do Metallica. Os Load e ReLoad têm ótimas canções de hard rock, a fase caipira do Garage é muito divertida, o S&M (com a orquestra) é um show fantástico e a banda sempre mandou bem ao vivo. Mesmo assim, esse momento de voltar às raízes sem soar anacrônico é muito saudável e louvável para uma banda que experimentou muita coisa nessa vida (os médicos que cuidaram da reabilitação de James Hetfield que o digam). Sem querer ter o mesmo discurso dos xiitas do metal, a melhor coisa que a banda poderia fazer depois do desastre sintético do último disco e das galhofas contra a distribuição de música pela Internet era justamente voltar ao casulo e recomeçar só os quatro com seus instrumentos, reunidos entre passado e presente para acelerar riffs e reproduzir os antigos sons explosivos que deram origem ao que eles atualmente são.

Confira se o Metallica ainda está em forma aqui!

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Pelo caminho tortuoso sem vacilar

Há sempre um momento em que você se vê diante de um impasse. A vida do homem adulto é cheia desse tipo de coisa: tomar decisões, tecer comentários, escolher caminhos...

Quando uma banda lança um disco novo e este chega às minhas mãos, uma pergunta que eu sempre me faço, como forma de exercitar o raciocínio, é o que aquele material quer expressar. É um momento da banda?, é cara-de-pau deslavada?, é um disco para fazer dinheiro fácil?... E por aí vai. São diversas as possibilidades. E nenhuma serve como opinião definitiva a respeito. É preciso enxergar além.



Ao conhecer o The Walkmen, em meados de 2004, tive a nítida impressão de que poderia gostar daquela banda para sempre. Era como se eu tivesse conhecido um novo The Strokes [só que mais criativo] ou um novo Led Zeppelin. Cada música escutada era uma surpresa e um arrepio diferente, uma sensação de estar diante de algo que eu poderia admirar indefinidamente, tamanha era a pungência das canções de Everyone Who Pretended to Like Me Is Gone [2002] e Bows + Arrows [2004].

Então veio 2006 e o lançamento de dois disco do Walkmen que me fizeram pensar muito bem a respeito do que representavam para mim: A Hundred Miles Off e Pussy Cats. O primeiro, com inéditas do grupo; o segundo, uma regravação do clássico de Harry Nilsson, gravado em 1974 e produzido por John Lennon.

Nos dois primeiros discos da banda, existem “intros”. They're Winning , do Everyone Who Pretended to Like Me Is Gone e What's in It for Me, do Bows + Arrows começam devagar, num clima de “vamos começar a brincadeira com calma”. Já o A Hundred Miles Off quebra essa idéia e inicia já com uma canção ainda com os timbres do The Walkmen, mas mostrando que Paul Maroon (guitarra, piano), Walter Martin (orgão/baixo), Matt Barrick (bateria), Peter Bauer (baixo/orgão) e Hamilton Leithauser (vocais/guitarra) já pensavam em fazer algo diferente. No Pussy Cats, como um disco de covers e maldito dentro da banda (como deram entender numa FAQ que ficava disponível em seu site oficial), não há essa idéia e é um álbum que pode ser facilmente ignorado dentro da discografia dos rapazes. O primeiro era criativo, mas diferente. O segundo era dispensável. Acabava ali a minha admiração pelo The Walkmen?



Então chegamos a You & Me. Quando ouvi o disco pela primeira vez, não soube o que dizer a respeito. Bom? Ruim? Inspirado? Mais do mesmo? Simplesmente não sabia. E me preocupei. Foi preciso escutar bem, várias e várias vezes, para entender que aquele ainda é um material que dá pistas dos novos caminhos da banda, sem revelá-los completamente. Em A Hundred Miles Off há músicas bem rápidas, mas diferentes dos moldes que a banda apostava. Aqui em You & Me, as faixas rápidas praticamente desapareceram. In The New Year (as festas de fim de ano são um tema recorrente na obra dos rapazes) é a única que ainda mantém um pouco da banda que o Walkmen foi.

E não há nada de errado nisso. Absolutamente nada. As 14 canções lá contidas são (agora posso dizer) inspiradas e tocantes, sem cair na pieguice. É fato que o Walkmen não é uma banda dada a falar de amor nas suas canções. Até são, mas de uma maneira peculiar, sem abusar das imagens usuais. Falam de relacionamentos sem nunca abusar do açúcar no processo. São justos até nisso.

A banda continua afiada, com seus teclados em camadas e bateria fantástica e emocionante (fazendo a cama para os riffs e melodias das guitarras). A voz de Leithauser, caso a parte, é impossível de ser ignorada, mesmo que por vezes ele emule um pouco de Bob Dylan e de Bono Vox. Ainda assim, mais e mais, o vocalista consegue firmar sua identidade: gritos e agudos precisos e urgentes.



Se os outros lançamentos atendiam bem ao propósito de emocionar pela violência das músicas, You & Me demonstra ser um trabalho ideal para se ouvir no fim de uma tarde de domingo, conversando na varanda com um amigo ou com alguém que se gosta, ou talvez lendo um livro, ou ainda antes de ir dormir. Este Walkmen não é mais um grupo que atenda às batidas secas de uma pisca de dança. Esses dias, mesmo que não necessariamente de forma perpétua, estão para trás. E olhar adiante, para o futuro do The Walkmen, a mim, como fã, é bastante animador. Mostra um grupo criativo, ousado e, na sua essência, disposto a experimentar.


Este disco está disponível aqui.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

(des) Repetindo
Por Jader Pires


A capa do novo álbum do Weezer parece a de um velho álbum do Weezer. O prazer de não dar nomes aos seus trabalhos se repete neste carinhosamente apelidado “Red Album”. O sexto disco da banda é chamado de Weezer e também tem os quatro integrantes em poses que evitam pose para a foto, assim como os outros “Weezers” (Blue Album e Green Album, 1994 e 2001 respectivamente), mas com um fundo vermelho exagerado. Parece coisa de criança, mas a direção é outra.

A banda parece ainda manter uma adolescência de melodias despretensiosas, mas ganhou consistência não soando mais tão bobinha. Assim como os coloridos anteriores marcaram quebra de paradigmas, esse outro álbum sem nome e ilustrado de um rubro berrante volta a entortar os caminhos do quarteto californiano, desta vez com um som mais encorpado e composições menos neuróticas de Rivers Cuomo, que cria um paradoxo de se importar menos pra se importar mais.





Troublemaker, Pork And Beans e Dreamin’ são as únicas canções que lembram mais aquele velho Weezer quase infantil e sem permissão pra dirigir, com suas distorções marcantes e letras que reclamam as cobranças dos mais velhos e responsáveis (Pork And Beans, aliás, foi concebida após uma cobrança da gravadora da banda por um novo hit depois dos “fracassos” dos dois álbuns anteriores). Mas são canções mais coesas que os antigos materiais dessa banda jovem que acaba de ficar mais velha, naquela fase em que não se é mais criança, mas tampouco se tornou adulto.

The Greatest Man That Ever Lived é uma ode irônica e desvairada em atos muito bem alternados entre a calmaria, a loucura, a certeza e o desespero, tanto nas melodias quanto na letra. O que vem depois é a maturidade de não se preocupar tanto em agradar e aproveitar o ensejo para experimentar.



Rivers Cuomo, ex-rebelde mimado que largou a carreira por um tempo para, vejam só, terminar a faculdade em Harvard (muita rebeldia prum nerd só), aprendeu a dividir as composições com os outros integrantes da banda. Cedeu espaço para o baterista Pat Wilson assinar e cantar Automatic, enquanto o guitarrista Brian Bell escreve e canta Thought I Knew, uma cançãozinha sobre desculpas e pensamentos equivocados e Scott Shriner canta e assina parceria com Cuomo em Cold Dark Horse, uma das mais diferentes do estilo da banda, assim como o potente rap-rock Everybody Get Dangerous e as poéticas Heart Songs e The Angel And The One, que são muito mais contidas nas distorções do que as outras baladas da banda.




A experiência da maturidade (no caso de Cuomos, um matrimonio e a paternidade) sempre agrega tranqüilidade, mesmo pra fazer um rock’n roll mais bem pensado e variado, o que me lembra um ditado dos mais velhos: “Não é força, meu filho, é jeito”.






Confirme se é a força ou o jeito que permeia o novo do Weezer Aqui!

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

O não travestido de sim e a mentira

A negação sincera, desprovida de pecado ou de más intenções, é libertadora. Há quem afirme que a sinceridade tem seus méritos, todos os méritos, mas a negação, aquela que abraça os fracos, os covardes, os reais, eu e você, é mais palpável do que a verdade extremada, do que a sinceridade crua.




Ida Maria, cantora e guitarrista norueguesa de 24 anos, finaliza seu primeiro disco, o interessante Fortress Round My Heart, negando. Em “See Me Through”, título sugestivo para quem teve criação católica, a jovem nega a existência de Deus, o mesmo personagem que ela clama logo na primeira faixa, a pesada “Oh My God”.

Nas dez faixas do álbum lançado em 2007, Maria parece, contraditoriamente, imergir para um poço de sinceridade, de verdade, de transparência. “You think I’m in control?” é o que ela diz na primeira faixa, quando clama pela atenção de Deus. Mas que dualidade é esta que toma conta da expressão artística de uma menina de 24 anos?

Ora, é simples: esta é a dualidade presente em qualquer jovem ou artista, com mais ou menos 24 anos. É a dualidade de quem pensa muito, não somente por que tem muitas dúvidas e perguntas, mas principalmente por que os pensamentos fluem em torrente. E essa cachoeira que jorra incessantemente da boca de Ida Maria traduz as angústias comuns [mas nunca triviais] de quem pensa muito. E perceba: muito não é demais.




As temáticas das canções da norueguesa, cujo timbre de voz lembra uma Feist menos meiga e mais urgente, passeiam entre as inseguranças em relação ao mundo, como na já citada “Oh My God” e em “Keep Me Warm”. Esta última também resvala num outro tema caro à artista, o amor. São várias as referências a este sentimento tão vil e avassalador. Parece piegas falando assim, mas negue se tiver coragem. “Drive Away My Heart”mescla o amor com a entrega total e voluntária, “Louie” trata o sentimento na ponta da unha, com ironia e cara de pau, “Stella” pergunta se você está mesmo disposto a amar e “Queen of the World”, escancarando as mazelas da insegurança [sim, ela novamente].

“I Like You So Much Better When You're Naked”, minha canção preferida no disco, trata da insegurança [recorrente, não?] e tem título auto-explicativo. A melhor solução para dar fim ao frio no estômago, ao escapulir das palavras, ao vício provocado é a libertação do que se veste. Ida sabe e propaga isso, mesmo que sem entender com um cara apenas "kind of sexy" consegue deixá-la tão nervosa.




O que mais me desperta emoção no álbum de Ida Maria não é a pegada que algumas músicas têm, ou a confidência nas letras. É a dualidade. Confessar não é o suficiente quando se tem 24 anos ou se é artista ou se ama ou se mente. É preciso ser duo, dois, vários, uma contradição atrás da outra. Não, isso não é uma regra. Mas dentro do jeito natural com que Ida Maria diz certas coisas, fica até com cara de que seja.




Este disco está disponível aqui